20 dezembro 2006

Lembranças de Buenos Aires

Já que é tempo de férias e talvez você vá a Buenos Aires. Então, deixe-me contar algumas lembranças minhas da grande metrópole Argentina. Buenos Aires é difícil de entender. Primeiro há a Província de Buenos Aires cuja capital é La Plata. Buenos Aires não é a capital da província onde ela fica. Mas é a capital do País. No falar argentino se diz “Capital Federal” e aí Bs As, como todos abreviam na escrita, é a capital do País, sede do Governo Nacional, ministérios, onde estão as embaixadas.

Mas ainda há uma outra Buenos Aires que limita-se ao município. E aí a coisa complica um pouco para o brasileiro. Esta Buenos Aires - se chama Cidade Autônoma de Buenos Aires e em vez de prefeito tem um governador. Então não pergunte “onde fica a Prefeitura? Não tem. Tem “Gobernación”. Um cargo e tanto.

Daí vem o falar todo especial. Ninguém diz: à rodoviária ou à Terminal de Bus. Dizem vou ao Retiro. Retiro é todo o bairro ao redor do Terminal de "Bus" de Retiro, onde há também terminais de várias linhas de trens. Outro costume é dizer: o vôo sai do Aeroparque ou do Ezeiza; O primeiro é o Aeroporto ou Aeroparque Jorge Newberry, o equivalente ao Congonhas de São Paulo ou Santos Dumont do Rio. O Ezeiza é o Aeroporto Internacioinal. Lá só se fala em Ezeiza e se esquece de se complementar que é Ezeiza é o Aeroporto Internacional que fica na comunidade do mesmo nome - no chamado Conurbano Bonaerense (Ver mapa).

Daí vem os bairros interessantes. San Telmo é um bairro repleto de antigüidades, à venda. Bairro orgulhoso. Tão orgulhoso que uma plaquinha declara “República de San Telmo”. E daí vem o bairro da Boca - ou "República de la Boca" onde há um pedaço de rua chamado "Caminito". Aquele pedaço de rua é muito interessante. É um bairro que fervilha. Mas esconde um dia-a-dia, romântico. Um dia eu estava em um restaurante na proximiodade do Caminito com um amigo de Buenos Aires. Uma moça dançava tango com turistas. Era linda.

O amigo logo quis “paquerar” a moça. Quando ela olha pra ele, ele diz aquele famoso: você não é filha do fulanito? Cómo creciste? Te carreguei no colo. Cantei pra ti dormi. E etc. Daí uma cantora judia e de esquerda cantava velhos tangos e outros compassos também para os turistas. O restaurante é também galeria. E nas paredes há muitos quadros. Muitos, da cantora que também é pintora. Ela veio conversar com a gente na mesa. O meu colega informa que sou jornalista e escritor. Ela quer saber qual é a linha de meu jornalismo e de minhas escritas. Buenos Aires estava saindo do primeiro “panelaço” e do “curralito bancário”. Eu disse que minha tendência é de consciência social. Ou sei lá o quê. O colega diz: não você é um pouco anarquista. A moça não disse nada. E saiu.

Estávamos almoçando quando um senhor, 70 anos, um pouco manco, entra no restaurante cheio de holandeses, franceses, brasileiros e grita: quem é Jackson? Eu me apresento. E o velhinho abre os braços e diz: “bienvenido, yo soy vice-presidente de la Federación Libertária Argentina e é uma prazer ter um anarquista do Brasil aqui na Boca. Gelei. Anarquista, eu? O senhor me convidou para uma reunião familiar ali mesmo por perto. Lamentou que o anarquismo morreu. Escutei histórias da vida. Dos trabalhadores da Boca, dos potuários, da luta, da vida. Como surgiu o bairro? O meu colega me disse: "eu avisei que a Boca não é fácil. Já lhe descobriram. Você tem tudo aqui só porque você é uma anarquista. Isso aqui é um mundo muito pequeno!

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