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27 outubro 2009
Favela Turismo: Visita ao Morro Tavares Bastos no Rio
Fotos: 1) Este blog-jornalista, Malu e Bob, Olliver e Magdalena, Cacau; 2) Terraço estilo mediterrâneo do The Maze Inn 3) Capa do caderno de turismo da Gazeta do Iguaçu
Experiência enriquecedora é sócio-cultural e solidária; envolve aventura e descobertas
Jackson Lima
Do jeito como as coisas andam, pensar em ir ao Rio de Janeiro dá medo. Para estragar a festa da conquista das Olimpíadas de 2016, houve o caso do confronto de gangs na Zona Norte da cidade que resultou em mortes de bandidos e policiais e um helicóptero da Policia Civil abatido. Andando pela Rua do Catete, próximo ao antigo Palácio da Presidência da República – hoje Museu da República – e olhando para a esquerda no sentido, Catete – Cinelândia, aparece um morro.
Na encosta do morro, casas e barracos. Perguntei a várias pessoas como se chamava. Disseram que não sabiam. O Catete (o bairro) ainda é charmoso. Me hospedei em um hotel econômico. Chuveiro quente, cama, café da manhã, perfeito. Tentei ir à praia do Flamengo após concluir o trabalho na ABAV. Tive a impressão de que ficaria sem a câmara fotográfica da Gazeta do Iguaçu, se fosse. Havia uns figuras lá. Recuei. Fui para o lado contrário, na direção da favela. Daí aconteceu a melhor coisa que eu poderia esperar.
Avistei uma pousada ou Hostel na Rua Silveira Martins, A Art Hostel Rio. Entrei, me identifiquei e pedi material sobre roteiros de turismo alternativo para o público jovem de corpo ou espírito: asa delta, parapente, paraquedas, surf, favelas tur, jeep tur, aventura, turismo social, cultural, rural, gay, religioso, nova era, tudo. Logo o gerente, Eduardo Ohm, me disse que o Hostel tem um trabalho com a Favela Tavares Bastos – aquela do morro. Eles não dizem favela. Dizem comunidade. “Temos um passeio agora que vai levar um casal. Se você quiser ir vai sair agora”, explicou. Cinco minutos depois, eu estava acompanhando o guia, ex-campeão de patins e artista plástico Alexandre Blasifera e o casal Olliver Jansen, alemão e Magdalena Stachura, polonesa.
Na comunidade
Na esquina pegamos uma kombi (R$2.00), no estilo transporte alternativo da Novela Duas Caras e subimos até onde deu. A Comunidade ou Favela Tavares Bastos é talvez, a única no Rio sem tráfico de drogas. Desde 2000, garças a uma campanha do inglês Bob Nakdarni, o Batalhão de Operação Policiais Especiais (BOPE) tem seu quartel lá. Antes ficava em Niterói. E, como é de se esperar, os homens do BOPE treinam lá. À pé pelas ruas estreitas, Magdalena me disse que se sentia no Marrocos – por causa das ruas estreitas. Vimos brasileiros trabalhadores normais. Crianças descendo o morro indo para a escola. Gente indo e vindo do trabalho. As casas muito juntas, porta com porta. “O problema é fazer amor. Todo mundo escuta”, destacou Blasifera que dirige o Centro Cultural Zezé Mota e é parceiro musical de Flávio Venturini.
Estamos indo para The Maze Inn (O Labirinto), pousada e centro cultural dirigido por Bob Nadkarni, o inglês, casado com uma alagoana, com vários filhos, ex-repórter da BBC, Reuters e UPI. Toda primeira sexta do mês, o The Maze abre as portas para um show de Jazz – trompetista chefe: Bob Nadkarni. Shows de terceiros também acontecem com frequencia (ver site). A entrada para o show de jazz é R$ 60,00. Tem noite que vem 500 pessoas. Os clientes vem do asfalto. Do Hotel Copacabana Palace, Gloria, e outros além de gente da cidade. “De vez em quando tem um ou outro que pergunta, disfarçado, onde está o Bagulho”, conta. “Eu mando calar a boca e mostro o caminho de volta. O povo do asfalto reclama da droga da favela. Mas quando sobem só pensam em droga. Eles financiam o tráfico” diz Bob com seu vozeirão.
Na pousada, havia vários hóspedes. Christine, dançarina inglesa está dado umas aulas enquanto ficar no Rio. Há outros de outras nacionalidades. O professor de educação física, Cláudio Gonçalves Pinheiro (Cacau), seis vezes campeão brasileiro de frescobol e professor de Beach Volley* na Praia do Flamengo, sempre morou e hoje dá aulas de dança e esportes no morro.
“Em que momento o senhor decidiu deixar de ser repórter da BBC e ficar aqui e trabalhar para a comunidade? – perguntei. Foi um erro. “Eu não trabalho para a comunidade. Eu moro aqui. Faço o que gosto, pinto meus quadros. Dou meus shows e vivo minha vida do modo que para mim é certo e pleno”, respondeu. Ele acrescentou que o que mais há no morro é ONG de ladrão. “Quem trabalha para a comunidade aqui está ficando rico”.
Saímos da The Maze Inn para conhecer o Projeto do nosso Guia, o Espaço Cultural Zezé Mota. Ainda está em construção. “Mas já é a melhor vista do Rio de Janeiro que você pode ter de um só lugar”, disse Alexandre. Magdalena Statchura e Olliver Jansen adoraram. No caminho, um encontro não esperado. Oficiais do BOPE estavam treinando uma nova turma. Eram os alunos que conseguiram passar pelo treinamento rigoroso que o filme Tropa de Elite mostrou. Ao longo do caminho, oficiais de mando, silenciosos, observavam os candidatos postados nos becos, corrigiam posições e ensinavam. Armas pesadas mas sem bala (pelo menos as dos recrutas). Desde que o BOPE está no morro, o trafico acabou.
“Não é uma boa idéia ser pego com droga aqui”, disse Alexandre. Antes de 2000, o atual prédio do BOPE estava abandonado. Hoje, a presença do batalhão garante a paz. Embora Bob diga que não faz nada a mais do que viver, as pessoas contatadas afirmam que ele é o homem que realmente trouxe paz para o morro. Assim, considere, um visita à Comunidade.
Notas:
Este material foi publicado no Caderno de Turismo da Gazeta do Iguaçu (Capa acima) em 28.10.2009 sob o título: Gazeta visitou o Morro Tavares Bastos no Rio. Republicado aqui com autorização! Este assunto prossegue neste e outros blogs!
Algumas informações foram corregidas.
* O esporte que Cacau ensina é beach tennis e não beach volley.
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